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A tecnologia é o veículo, não o piloto

Sempre que falo de utilizar a tecnologia como ferramenta de aprendizagem recebo feedbacks de educadores que tentam introduzir esses instrumentos nos espaços educativos e tem dificuldade em identificar onde fica o limiar entre a construção do conhecimento e a distração proporcionada pelos aparelhos.

De fato, não é um limite fácil de identificar e por tanto é difícil de respeitá-lo. Observe o nosso comportamento utilizando aparelhos eletrônicos, nós podemos iniciar o uso conscientes e atentos, mas é muito difícil nos manter focado com o passar do tempo, provavelmente pela quantidade inestimável de informação, há qual nosso sistema não está evolutivamente adaptado para dominar, portanto, muitas vezes somos dominados.

Existem diversas receitas para melhorar nossa relação com a máquina, principalmente quando se fala em crianças e uso de telas, algumas das soluções se baseia em limitar a quantidade de tempo de acordo com a faixa etária da criança, outras em restringir determinados sites, aplicativos e conteúdos, concordo que limites externos são essenciais neste assunto, mas gostaria de focar essa discussão para a raiz do problema.

A distração, ou incapacidade de comandar nossa atenção, é um dos maiores sintomas da nossa relação insalubre com as tecnologias, mas será que a causa é a tecnologia? Ou será que a forma com que nos relacionamos, tendo nossa atenção, atividades, criação, expressão e aprendizado super direcionados externamente nos tornou incapazes de interagir com o mundo dirigindo nossas próprias ações?

Certo dia, Valentina nos perguntou se dava pra trabalhar de artista, ela adora desenhar e vem aprimorando sua técnica de forma autodidata, de forma espontânea e contra a lógica educativa nós a apresentamos um perfil do instagram de uma desenhista profissional que conhecemos.

Ela passou alguns minutos em êxtase observando as imagens, dava zoom, olhava de lado, relacionava as imagens, passou todo o conteúdo do perfil e perguntou se tinha mais alguém que a gente conhecia, fomos a barra de pesquisar e digitamos “ilustração”, um universo se abriu, agora existiam diversos tipos de técnicas, materiais, estilos e temas a serem explorados, nesse momento ficamos apreensivos observando se ela ia ser ‘abduzida’ da sua pesquisa e se tornar uma expectado passiva que apenas rolava para baixo, por um momento isso aconteceu, mas depois de investigar vários perfis voltou para a página de pesquisas, reencontrou um desenho e falou:

Tira uma foto desse pra mim?

Saiu buscar seus materiais de desenho, ia iniciar uma cópia, mas já foi avisando que “não vai ficar igualzinho”.

Eu acredito em momentos como este, em que a tecnologia nos permite abrir portas, expandir nossa compreensão do mundo a partir da informação, ser ferramenta para nos conectar aos nossos interesses, ser suporte para nossas criações.

Mas para isso, temos que permitir, não restringir e devolver a cada indivíduo a capacidade de pilotar seu próprio aprendizado.

Para isso é necessário modificar a maneira como nos relacionamos, principalmente em relação as nossas crenças de como o desenvolvimento da educação acontece, cultivar em nós a confiança de que cada um é capaz de aprender e desenvolver habilidades a partir de uma relação menos impositiva, uma relação onde nós adultos acompanhamos e guardamos, mas interferimos apenas no que é necessário.

Em uma época em que a tecnologia permite as crianças e adolescentes chegarem em todo canto do conhecimento, precisamos educar pilotos, não passageiros.